Diácono Carlitos: O acolhimento da pessoa com deficiência na comunidade

“Jesus afastou-se com o homem, para fora da multidão; em seguida, colocou os dedos nos seus ouvidos cuspiu e com a saliva tocou a língua dele.”

Marcos 7,  33

 

A deficiência não pode ser uma barreira definitiva para o indivíduo, nem mesmo para a sua família. Todos têm o direito de fazer parte da vida comunitária.

 

Eu, Diácono Carlitos e minha esposa Valéria, fomos convidados para um momento de partilha com os diáconos permanentes da nossa Diocese, no mês de Junho de 2024 no Seminário Diocesano Santa Teresinha e nesse texto vamos tentar transmitir um pouco do que falamos naquele dia.

Trouxemos para esse dia formativo,  o testemunho de nossa vivência em família. Ambos viemos de famílias católicas e participantes, da minha família um dos meus irmãos exerceu o ministério sacerdotal, já a minha esposa fez uma experiência de vida religiosa na Congregação das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada, porém, nossa vocação era para a vida matrimonial. Durante a nossa juventude atuamos em pastorais e movimentos da igreja em nossas paróquias, até nos conhecermos. Hoje, somos casados há 24 anos e pais da Mariana, 22 anos e do Wagner com 20 anos. Desde o início da nossa caminhada matrimonial consagramos nossa família à Deus. Nossa primeira filha, Mariana recebeu esse nome que foi escolhido para que ela fosse consagrada à proteção da Virgem Maria. Já o nosso segundo filho recebeu um nome do nosso ex-pároco e grande amigo Padre Wagner que faleceu no ano de 2003. Uma frase marcante do Padre Wagner “Oh, meu anjinho”, maneira carinhosa que ele se dirigia para seus paroquianos. Hoje, sabemos que na verdade o Anjo era ele.

Somos gratos à Deus por nossa história e nossa família. Nosso filho Wagner, nasceu no ano de 2004, um menino saudável, com o passar do tempo e início da primeira infância, percebemos que havia algo diferente em seu desenvolvimento. Ele tinha preferência pelo isolamento, demorou para falar, não olhava nos olhos e não atendia quando era chamado pelo nome.

Nosso filho foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista com 3 anos de idade. O que aprendemos é que o Autismo é um transtorno do desenvolvimento, que a arquitetura cerebral é diferente, o funcionamento dos neurônios ocorre de maneira desregulada em diferentes áreas cerebrais.  Cada indivíduo apresenta os sintomas do autismo de maneiras distintas.

A partir daí iniciamos nossa busca pelos melhores tratamentos que estavam ao nosso alcance. Foram anos de acompanhamento psicológico, terapeuta ocupacional, fonoaudióloga, além de empenho e cuidado de toda a família. Nosso filho começou a falar com muito atraso, aos 5 anos de idade, seu grau de comprometimento é moderado. Ele é uma pessoa totalmente inocente e pura de coração, necessita de cuidados constantes. Sua rotina diária inclui, além dos desenhos e programas preferidos, a oração do terço e a Missa na TV Aparecida.

O objetivo da nossa partilha pessoal é ajudar os diáconos permanentes e todas as pessoas envolvidas em trabalhos pastorais a como acolher e integrar pessoas com algum tipo de deficiência em nossas comunidades paroquiais. É importante termos consciência para incluir, respeitar as limitações, orientar as famílias e principalmente acolher as pessoas com deficiências e suas famílias, inserindo-as na vivência paroquial.

É importante termos em nossas mentes, que de uma maneira ou outra, todos somos deficientes em alguma área da vida, ninguém é perfeito e auto suficiente, para dizer que não precisa de ninguém.

Você deve estar se perguntando: Como é conviver com uma pessoa com deficiência?

 

Podemos dizer que para nós é uma experiência de presença de Deus em nosso meio. Fomos presenteados com uma missão e queremos cumprí-la com muito amor e dedicação. Por inúmeros momentos sentimos a presença e bondade de Deus em nossa casa. É uma grande oportunidade de santificação pessoal em que muitos momentos exigem de nós uma renúncia de nossas vontades e desejos. É uma caminhada com oportunidade para um autoconhecimento, em muitos momentos, é um amor exigente em que necessitamos confiar com todas as nossas forças na misericórdia de Deus mergulhando em seus mistérios.

 

Mas, como acolher a pessoa com deficiência em nossa comunidade?

Primeiro, vamos entender o que é uma deficiência:

A pessoa com deficiência é aquela que tem impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial que, em interação com diversas barreiras, podem ter obstruída sua participação parcial ou  plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas.

 

As deficiências podem ter origem genética e surgir no período de gestação, em decorrência do parto ou nos primeiros dias de vida do bebê. Na vida adulta, podem ser consequência de doenças transmissíveis ou crônicas, perturbações psiquiátricas, desnutrição, abusos de drogas, traumas e lesões.

Quais os tipos de deficiências mais comuns?

Fonte: UNIFESP – 2009

 

Na ocasião, compartilhamos algumas dicas:

  • – Acolher a pessoa com deficiência

Percebendo que existe algo diferente com a pessoa, porque algumas vezes a limitação não é visível, portanto, a postura esperada do cristão não é de ter “pena” da pessoa, mas de respeito por ela. Afinal, Deus ao criar o ser humano, fez cada um único, sua imagem e semelhança. “Todas as vezes que vocês fizeram isso a um desses meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizeram.” Mt. 25, 40.

  • – Acolher a família e seus cuidadores.

Muitas vezes, a família necessita apenas que alguém ouça o que elas têm para dizer, ou seja, desabafar para aliviar. Recebendo ânimo para prosseguir com sua missão. Somos chamados a cuidar de todas as ovelhas. Preste atenção nas pessoas isoladas, muitas vezes lembramos daqueles que estão próximos de nós, mas existem pessoas que são tímidas, tem dificuldades de se relacionar por diversos motivos: vergonha, timidez.

  • – Ter empatia.

Aqui cabe uma experiência na paróquia em que exerço o meu ministério diaconal. Fui procurado por uma mãe que há tempos desejava batizar seu filho de 4 anos de idade, porém, sua preocupação e demora em trazê-lo para batizar foi pelo fato dele ser autista e seu comportamento agitado, falava constantemente e não conseguia ficar parado por muito tempo. Então, me apresentei como pai de uma criança autista que sabia exatamente e compreendia suas preocupações de mãe.  O que combinamos: agendamos seu batizado para que fosse realizado individualmente, somente ele, sua família e seus convidados. Na cerimônia combinamos que ele poderia ficar à vontade, todos que estavam ali eram responsáveis em cuidar dele, evitando que se machucasse ou saísse da igreja. A cerimônia transcorreu normalmente, respeitando as limitações dele. Todos saíram contentes desta celebração. Dependendo da deficiência, o barulho, tempo ou aglomeração de pessoas podem desequilibrar, despertando crises, sendo importante o diácono conversar antecipadamente com a família e se houver necessidade adequar o momento celebrativo ou formativo.

 

  • – Evitar julgamentos

Todos nós somos únicos. “Não julguem para não serem julgados.” Mt 7, 1.

Em muitos momentos, corremos o risco de olharmos para os outros e fazermos pré julgamentos, sem conhecermos as realidades vividas pelas pessoas.

 

Pensando na sua Paróquia, como contribuir e organizar junto com a minha comunidade para atender  as adaptações razoáveis,  conforme a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI):

  • – Rampas de acesso
  • – Bancos reforçados (pessoa com obesidade)
  • – Banheiros adaptados
  • – Tradutor Libras
  • – Inclusão nas pastorais
  • – Catequese inclusiva com adaptação e flexibilização do conteúdo
  • – Estacionamento com vagas reservadas
  • – Formação das lideranças e agentes de pastorais

O nosso intuito em compartilhar nossa experiência de pais de uma pessoa com deficiência foi de colaborar com a seguinte reflexão: Nós, como igreja, como integrar e acolher essas pessoas e famílias em cada comunidade?

É preciso deixar nosso olhar de “dó” ou “pena” para um movimento de ação fraterna e cristã.